quarta-feira, 27 de maio de 2009

Só casando!

Agradável surpresa. Agradável e perturbadora. Numa mostra de cinema na Caixa Cultural aqui no Rio, que estará em cartaz de 19 a 31 de maio, estarão sendo rodados alguns filmes (20 longas e 3 curtas), tendo como tema o erotismo. O recorte histórico é compridinho, indo do fim da década de 10 até a retomada, com Madame Satã entre as seleções. Há também um minicurso organizado pelo curador da mostra, do qual perdi o primeiro dia, só começando a acompanhar a conjuntura do cinema erótico brasileiro a partir da década de 30 até a época das chanchadas.

Isso é o panorama geral. Mas a surpresa mesmo foi de encontrar duas obras de Nelson Rodrigues adaptadas para a película e rever uma delas nessa linguagem (já a havia visto no palco), Toda Nudez Será Castigada, dirigida por Arnaldo Jabor; a outra, Vestido de Noiva, só ouvi falar, ainda não vi nem a encenação. Um viúvo atormentado pela morte da esposa e que prometera a seu filho não se casar com uma outra se vê, de repente, na cama com uma prostituta, graças ao irmão, que teve essa idéia brilhante (1) para livrá-lo dessa neura. A princípio enojado com toda sua moral conservadora, Herculano se vê atraído por Geni, que lhe prega uma peça inspirada por Patrício, seu irmão: Só toca em mim casando, viu?! Só casando! Após decidir contrair o matrimônio com ela, ainda há o problema com Serginho, o filho ensandecido pela promessa do pai em se manter viúvo; esperneia, é estuprado na delegacia após fazer confusão num boteco (e fugirá, ao fim da trama, com ele - o ladrão boliviano), mas arma uma chantagem com Geni: ela se casa com Herculano, mas o trairá com o filho...


Mas, chega de resumos que isso é feio! Nelson Rodrigues, se era mesmo reacionário - desconheço maiores detalhes de sua biografia - pelo menos era pespicaz. Geni, derretida de paixão por Herculano, ao soltar o mantra matrimonial - lembremos, só casando! -, não deixa de jogar com a moral mesquinha do Brasil de então (2). Se é pra segurar o homem amado (!!!), e se o jeito é dançar conforme a música, então que ela saia pelo baile da vida a rodopiar trágica. Porém, nesse mesmo momento ela rompe com o estigma que lhe impõem - mulher de vida fácil, vagabunda, e etecéteras rançosos e sonsos; convida, ou melhor, obriga Herculano a largar seus chiliques anacrônicos e a dar um novo rumo a sua vida. Sua fantasia, no entanto, se vê desmanchada por Serginho, que a chantageia; consumida por essas cenas, e após vê-lo fugir com o ladrão boliviano, corta os pulsos e conta a verdade àquele que atraiu seus anseios de mulher. Da parte das tias de Herculano, eu até entendo: as velhas ficaram para tias mesmo, solteiras e malcomidas; só que ainda especulo qual o motivo da promessa que Serginho obrigou o pai a fazer.
Mais algo a dizer? Bom, com tanto puteiro aqui no Rio é capaz de eu separar uns trinta, quarenta reais e ver que tipo de peripécia me espera...
(1) Brilhante e lúbrica.

(2) O que não ajuda muito.

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Baú de traças