terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

FSM Belém 2009: balanço atrasado e relapso

Nem sei por onde começar. Pela entrada da UFPA? Da UFRA? Talvez seja melhor fazer um apanhado bastante rizomático, contando apenas com o que eu lembrar. Belém, Cidade das Mangueiras, as voluntárias na Almirante Barroso entram no ônibus oferecendo informações gerais e falando pra gente tomar cuidado com as mangas na cabeça – quando o melhor seria mesmo tomar cuidado com nós mesmos. Com a cabeça ancorada no presente e se projetando para o futuro, não houve como não me deliciar com a Cidade Velha, um bairro inteiro de construções antigas e não fotografadas. O açaí amargo apesar do açúcar e da farinha (tem paraense que grita se adoçar!), o tacacá, pupunha e cupuaçu: mais itens para a memória gustativa. A família hospitaleira e tagarela – e eu achando que minha língua era solta e desmemoriada, meu Deus!, quantas vezes fui inquirido se tomava algo durante o almoço -, mas nada de ingratidão. A conferência de abertura do ENEFIL, bem esclarecedora acerca de meus planos para a pós-graduação, e a única coisa que aproveitei do encontro de meus colegas de curso, ocorrido ao mesmo tempo que o Fórum Social Mundial.

Mas, e então? Que fazer, em quais oficinas participar, quais debates acompanhar e dar a cara a tapa? Perdi muito da programação entre preguiça, atividades canceladas, atrasos e mudanças feitas em cima da hora. Deu pra conferir, no entanto, a oficina de danças circulares, soltando um pouco mais o corpo e entrosando individualidades e coletividades; a caminhada de abertura, debaixo dum aguaceiro oportuníssimo e contagiante; a Feira Internacional de Economia Solidária dando uma amostra da força autogestora... Por outro lado, não conferi Lula mais Chávez e Morales nem Chomsky e Galeano, estes últimos na cidade sem companhia do Evento para chegar ao local. (Não tenho confirmação de fontes oficiais, mas se isso for mesmo verdade será difícil engolir.)

Entre as falhas, desentendimentos, sardonismos e dificuldades lá na capital do tecnobrega, me vêm à cabeça: 1) uns policiais dando provas secas de racismo, quando um deles soltou um “Esses preto safado” (não sei se alguém apareceu pra tentar furto ou outro delito, ou se foi um resmungo gratuito); 2) uma jornalista local, sobre os recém-nascidos de Terra Firme, soltou que choravam duas vezes – a primeira pra dar sinal de vida, a segunda pra distrair o médico enquanto afanam o relógio dele; 3) uma preiboizada compareceu em peso no Acampamento Internacional da Juventude. Deixou o peso da sujeira pela UFRA, certamente à espera de qualquer um que não eles para ser recolhida; 4) periferia é periferia em qualquer canto do planeta. Esse raciocínio indutivo, também válido para a estupidez e o preconceito no globo afora, explica cinicamente bem o fato de uns guris zoarem com meus cachos embaraçados, quando eu me dirigia de volta pra toca e dormir pro outro dia. Destilada a raiva silenciosa, no outro dia comentei o fato com uma garota, que contou uns episódios parecidos em algum bairro ou conjunto da Zona Norte de Natal (lembraê, Andresa!). E 5) uma venezuelana panfletando em apoio ao referendo de Chávez, que traveste totalitarismo em reeleição indefinida. Eu, pessoalmente, acho mais fácil o tenente-coronel copiar o exemplo do PRI no México, já que seria poupado o trabalho de mexer na Constituição.

Enfim, mais outras lembranças agradáveis: o guaraná Jesus, que presta pelo menos quando gelado; o lundu que lascou minhas cadeiras e me ajudou a tirar – muito bem, por sinal – as teias da boca; a feliz sensação de encarar a estrada longa sem riscos de Dramin ou cascas de limão. Da próxima vez, eu tomo coragem pra elaborar um registro mais detalhado, ou menos vagabundo.

Nenhum comentário:

Baú de traças